Fonte: O Globo, por Fábio Souza
Foto: O Globo/ Bruno Kaiuca
Os desafios das pessoas com transtorno do espectro autista (TEA) não se esgotam na necessidade de lidar com as manifestações dessa condição. A insuficiência de medidas de acessibilidade transforma o autismo num fator dificultador da participação no meio social para os quase 2 milhões com o transtorno no Brasil.
Na Seguridade Social, essa situação exige a adoção de medidas inclusivas capazes de promover igualdade de oportunidades. É de grande valia, portanto, a Política Nacional de Proteção dos Direitos da Pessoa com TEA, instituída pela Lei 12.764/2012 (Lei Berenice Piana), que inclui acesso à Previdência e à assistência social.
A estratégia legislativa para a proteção jurídica do autista consiste na sua equiparação à condição de pessoas com deficiência (PCDs). Nos termos da lei, “a pessoa com transtorno do espectro autista é considerada pessoa com deficiência, para todos os efeitos legais”. Desse modo, estende-se às pessoas com TEA a proteção garantida às PCDs.
A medida ganha relevância para autistas que não se amoldam ao conceito de deficiência, de acordo com critérios da Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência. Em geral, a caracterização da deficiência deve ocorrer por meio de avaliação biopsicossocial que constate um impedimento de longo prazo que, em interação com barreiras, possa obstruir a participação plena e efetiva na sociedade, em igualdade de condições com os demais.
Como o legislador, no caso do TEA, equiparou essa condição à deficiência, o diagnóstico de autismo supre a avaliação biopsicossocial, habilitando o diagnosticado a pleitear os benefícios destinados às PCDs.
No campo da Previdência Social, é possível identificar duas prestações destinadas à PCD, acessíveis de modo facilitado aos autistas: aposentadoria e pensão por morte.
A aposentadoria da PCD está disciplinada pela Lei Complementar 142/2015. O benefício pode ser concedido por tempo de contribuição ou por idade. Para a aposentadoria por tempo de contribuição, a exigência varia de acordo com o grau de deficiência, mas não há uma idade mínima. No caso de deficiência grave, a mulher precisa de 20 anos de contribuição e o homem de 25; para as situações de deficiência moderada, são necessários 24 anos de contribuição para a mulher e 29 para o homem. Se a deficiência for leve, a lei exige 28 anos de contribuição para mulheres e 33 para homens. Outra possibilidade é a aposentadoria por idade, aos 55 para a mulher e aos 60 para o homem, desde que haja 15 anos de contribuição com deficiência.
Além disso, a Lei 8.213/91 indica como dependente da primeira categoria o filho com deficiência intelectual ou mental, o que, por força da equiparação legal, inclui as pessoas com TEA. Assim, com o óbito de um segurado, o filho autista tem direito à pensão por morte, bastando que comprove o diagnóstico.
No campo da assistência social, a caracterização jurídica do TEA como deficiência auxilia no acesso ao benefício de prestação continuada (BPC), prestação devida às PCDs que não consigam prover seu sustento ou tê-lo provido por sua família. Diagnosticado o autismo, a discussão se limitará à prova da hipossuficiência econômica.
Em resumo, apesar de não existirem benefícios específicos para autistas, a equiparação jurídica dessa condição à deficiência reduz a desigualdade de oportunidades de acesso à proteção previdenciária e assistencial.
*Fábio Souza, juiz federal, é professor da UFRJ e do Instituto Connect de Direito Social